A vida cristã é uma peregrinação. Um caminho feito de passos, escolhas e esperas. E como todo peregrino, não caminhamos por caminhar: temos uma meta, uma direção. A fé é o mapa seguro que orienta essa jornada, conduzindo-nos em direção à “cidade” prometida — imagem bíblica de uma humanidade reconciliada, de uma sociedade de justiça e de paz que tem Deus como arquiteto e construtor (cf. Hb 11,10). Caminhar com fé é caminhar com esperança, conscientes de que já pertencemos a essa cidade, mesmo sem ainda vê-la plenamente construída.
O Evangelho deste domingo (10/08) nos recorda uma verdade essencial: o Senhor vem (Lc 12,32-48). E, mais do que esperar passivamente esse encontro, somos chamados a viver na vigilância ativa, com os “rins cingidos” e “as lâmpadas acesas”. Essas expressões, carregadas de sentido, apontam para uma postura interior: vigilância, prontidão, serviço. Não se trata de medo ou ansiedade, mas de amor vigilante. É o coração de quem espera alguém querido e, por isso, mantém a casa em ordem, a lâmpada acesa, os olhos abertos.
Jesus nos dirige hoje uma palavra de encorajamento e ternura: “Não tenhais medo, pequenino rebanho”. Ele conhece nossas limitações, nosso número reduzido, nossa fragilidade frente ao mundo. Mas é exatamente a esse “pequeno rebanho” que o Pai quer dar o Reino. Não por mérito, mas por amor. Esse Reino, já presente em nossa história por meio de gestos de fraternidade, justiça, perdão e serviço, é o verdadeiro tesouro que deve ocupar o nosso coração.
Nesse contexto, Jesus nos oferece três atitudes fundamentais:
Desapego e partilha: “Vendei os vossos bens e dai esmola”. O coração preso aos bens não se abre ao Reino. Nossa segurança não está em acumular, mas em confiar na providência e repartir com os que mais precisam. Só o amor compartilhado é riqueza verdadeira.
Vigilância fiel: “Felizes os servos que o senhor encontrar vigilantes”. Esperar o Senhor é viver cada dia com sentido, assumindo responsabilidades, cultivando a fé, perseverando no bem. A vigilância é um estado de confiança ativa, alegre e comprometida.
Responsabilidade no serviço: “A quem muito foi dado, muito será exigido”. Cada um de nós recebeu dons, tarefas, chamados. No Reino, não há espaço para omissão. O discípulo fiel é aquele que serve com amor, mesmo na ausência visível do Senhor, porque reconhece Sua presença no cotidiano dos irmãos.
A vigilância cristã é vivida no amor, na entrega generosa, na atenção aos sinais de Deus nos rostos dos pobres, dos sofridos, dos esquecidos. É também coragem para enfrentar um mundo que nem sempre compreende a lógica da cruz, da gratuidade, da esperança que brota da fé.
Não podemos nos distrair nem nos acomodar. O Senhor vem — não apenas no fim dos tempos, mas a cada dia, em cada encontro, em cada gesto de amor. E nos pergunta: onde está o teu coração? Porque onde está o nosso tesouro, ali também estará nosso coração (cf. Lc 12,34).
Neste Dia dos Pais, rendamos graças por todos aqueles que acolheram o dom da paternidade com responsabilidade e ternura. E rezemos pelos que partiram, pelos que sofrem, pelos que lutam com dificuldades. Que São José, pai justo e vigilante, interceda por todos os pais, para que sejam sinais vivos da presença de Deus na história.
Dom João Carlos Seneme, css
Bispo de Toledo