A sessão do Conselho Universitário que aprovou a concessão de Notório Saber teve a presença de Mãe Edna de Baru, ícone da preservação e da difusão da cultura e expressão negra em Foz do Iguaçu.

O título habilita a pessoa que o recebe a exercer a docência e contribuir com a pesquisa e extensão

O Conselho Universitário da UNILA, aprovou, na reunião ordinária de novembro, a regulamentação para que a Universidade possa conceder certificado de Notório Saber a mestras e mestres de Conhecimentos, Práticas e Ofícios Tradicionais e Populares. Na prática, significa que, a partir dessa certificação, essas pessoas poderão obter uma titulação equivalente ao doutorado.

Conforme explica a docente e chefe de gabinete da Reitoria, Senilde Alcântara Guanaes, o título habilita a pessoa que o recebe a exercer a docência e contribuir em pesquisas e projetos extensionistas. Ela pontua que “os conhecimentos tradicionais sempre foram utilizados pela ciência e sempre estiveram presentes na universidade”, em diversas pesquisas e áreas do conhecimento. “Por isso, a regulamentação do Notório Saber coloca em equivalência os cânones acadêmicos e os saberes tradicionais.”

Essa possibilidade deve contribuir, inclusive, com “a formação profissional dos nossos acadêmicos e com as pesquisas e ações desenvolvidas na universidade, possibilitando a redução de assimetrias históricas entre os portadores e portadoras desses conhecimentos e os demais cientistas, ao reconhecê-los como autoridades em determinados assuntos”, acrescenta Senilde. Para ela, “o título é também uma forma de proteção do patrimônio cultural, à medida que outorga mestres e mestras como guardiões e guardiãs dos saberes tradicionais, responsáveis pela preservação e transmissão desses conhecimentos para as gerações futuras”.

O Notório Saber é uma titulação prevista na legislação educacional brasileira, tendo como referência legal o parágrafo único do artigo 66 da Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB), que permite reconhecer e outorgar as experiências e conhecimentos extra-acadêmicos, ou seja, o conhecimento adquirido fora do ensino superior formal, que seja considerado notório, excepcional e relevante por uma banca julgadora. Porém, a UNILA é uma das poucas universidades brasileiras já habilitadas a conferir esse título.

Na UNILA essa regulamentação ganha um peso ainda maior porque a região da Tríplice Fronteira é marcada pela diversidade cultural, linguística e territorial. “A região possui uma dívida histórica com os povos e comunidades que aqui vivem: temos uma das maiores redes de populações tradicionais do Brasil, que é a Rede Puxirão; estamos em um território Guarani, uma das maiores etnias da América Latina; temos ainda as comunidades remanescentes de quilombos, as religiões de matriz africana, que são templos de saberes ancestrais”, diz Senilde. “Ou seja, são muitos mestres e mestras que têm muito a contribuir para um desenvolvimento econômico e social mais equânime, solidário e sustentável.”

Compromisso com a inclusão 

Para a reitora Diana Araujo Pereira a possibilidade da concessão do título de Notório Saber fortalece o propósito de reconhecimento da cultura popular. “Com isso reafirmamos nosso compromisso com os saberes populares e ancestrais, um reconhecimento que valoriza o conhecimento legítimo, originário da experiência, da memória e dos acervos ancestrais.”
 

A docente Angela Maria de Souza, que foi uma das relatoras do processo e é pesquisadora das relações étnico-raciais, acredita que a possibilidade de titulação deve ajudar a preencher uma lacuna importante na sociedade. “Pensando nas pessoas da comunidade externa, com as quais nós trabalhamos, muitas vezes, são pessoas que poderiam ter um título acadêmico, porém, por todas as contingências da vida, elas não têm. E aí entra o papel da universidade de ser uma mediadora”, observa.

Para ela, a universidade ideal passa pela relação que estabelece com a comunidade na qual está inserida. “O título de Notório Saber é também no sentido de pensar esse espaço de construção conjunta”, pontua. “O conhecimento produzido na academia é um tipo de conhecimento, não é o único. Ainda existe toda uma lógica hierárquica de saberes, como se o conhecimento acadêmico fosse superior aos demais. Só que muitos desses conhecimentos acadêmicos são produzidos e, às vezes, inclusive, apropriados das comunidades, das culturas originárias, das pessoas com as quais interagimos. Esses saberes estão ali, sendo repassados por gerações, por séculos, e são determinantes para a nossa própria sobrevivência e existência”, frisa.

O docente Clóvis Antonio Brighenti, que é pesquisador das temáticas relativas aos povos indígenas, ressalta que, com essa resolução, “a universidade se transformará numa instituição mais inclusiva e democrática”. “Na medida em que a universidade se abre para esses saberes, valoriza esses conhecimentos e seus portadores e ou detentores dos saberes, a instituição passa a dialogar num nível de Igualdade com as pessoas do entorno.”

O docente observa que mesmo na extensão universitária, que já uma aproximação com as comunidades, muitas vezes a postura ainda é de superioridade. “Sabemos que não pode ser assim, que os saberes devem estar em diálogo sem hierarquizar e precisamos desconstruir essa relação hierárquica. O notório saber pode se somar a essa iniciativa de criar relações horizontais com a comunidade, valorizando seus mestres de saberes”, diz ele. “Certamente as comunidades passarão a ver com outros olhos a universidade e seguramente as pessoas do entorno vão perceber cada vez mais que a universidade é um espaço plural, de acolhimento e que deve sempre estar aberta ao mundo.”

Fonte: Assessoria de Comunicação da UNILA